Capítulo 05
Priscila
ficou estática, parada sem saber o que fazer ou dizer. Tatiane soluçava ainda
abraçada a amiga, e nesse choro existia um desespero, suplico.
_Calma
Tati – alisou as costas da amiga.
_Como pude ser tão burra, amiga?
Mais
uma vez Tatiane se entregou ao choro. Priscila sabia que se alguém aparecesse
por ali iria perguntar sobre o que havia acontecido. Afastou-a um pouco,
levando-a para o sofá. Sentaram e ela deixou que a amiga extravasasse sua dor.
Naquele momento lembrou-se das inúmeras vezes que foi ao estúdio onde Tatiane
trabalhava e lá chorava a cada vez que Victor fazia algo de ruim para ela.
_Está
confiante em desabafar? – entregou para a amiga um copo com água enquanto
sentava ao lado.
_Foi o Cadu... Ele... – sua voz voltou a ficar embargada. – Como fui tão burra?
_Não se inferiorize assim, Tati. – a voz de Priscila foi ofuscada por a da
amiga.
_Ele estava o tempo todo me traindo com a Ivy e eu sequer notei.
Priscila
não iria agir de má fé, mas em sua expressão facial ficou a frase “era isso o
que eu queria te alertar”. Tatiane entendeu na mesma hora:
_Era
isso o que você queria me dizer naquele dia.
_Esquece isso, Tati...
_Só de pensar que naquele momento eu te humilhei por causa... deles! – Tatiane voltou
a chorar.
_Talvez eu falar não servisse de nada. Às vezes para acalentar nosso coração
somente vendo.
A
conversa iria continuar, mas o celular de Priscila tocou e ela saiu para
atender. Voltou em poucos minutos apenas para finalizar aquela conversa.
_Eu
vou buscar meus pais que chegaram no aeroporto. Sobe, fica no meu quarto.
Quando eu voltar conversamos melhor.
_Imagina, Pri. Estou te incomodando demais e nem mereço esse carinho todo.
_Tati, você é a minha amiga que nos momentos que mais precisei estava ali, sem
julgar. Então o que estou fazendo hoje é o mínimo. Fica, prometo que não vou
demorar muito.
_Obrigada – mais uma vez Tati buscou o abraço da amiga.
*
Durante
o percurso até o aeroporto a cabeça de Priscila era uma montanha de
acontecimentos somente naquele dia. Victor não voltaria para casa, Tatiane
havia acordado e descoberto toda a traição de Cadu, Pedrinho choroso com
saudade do pai. Respirou fundo tentando esquecer, mas era impossível. De longe
avistou Ícaro e Sandra com suas malas e completamente perdidos. Ao verem a filha,
abriram um sorriso largo e foram até seu encontro.
_Que
saudade de vocês! – sussurrou quando abraçou ambos ao mesmo tempo.
Saíram
em passos lentos conversando sobre o clima, pessoas, Pedrinho, presentes.
Priscila já estava saindo do estacionamento quando Sandra, que estava no banco
do passageiro, tocou sua perna tirando-a do mundo de pensamentos.
_E
como está sua vida?
_Bem mãe. Aproveitei mais esse fim de ano longe de trabalho, fiquei somente em
casa com o Pedrinho.
_O Victor me mandou um vídeo semanas atrás do Pedrinho quase andando. – Ícaro falou
sentado no banco de trás.
_Nem me fale sobre isso, pai. Aquele menino não vai ficar quieto e com isso já
teremos que providenciar grades pra que ele não desça a escada.
_Ele vai ser bem esperto – Sandra falou após alguns segundos todos em silêncio.
_Não sei se isso me conforta ou me deixa aflita – os três riram.
O
assunto prosseguiu sendo sobre Pedrinho e Priscila até que gostou. Estava
precisando de distração para não focar em seus problemas. Assim chegaram a
casa, Marisa ao vê-los levou o neto que prontamente começou a gritar de
alegria.
Priscila
aproveitou a alegria do filho com os avós e tocou no braço de Sandra para que
ela lhe desse atenção:
_Mãe
depois conversamos, tá? A Tati chegou hoje e está lá em cima. Mas a senhora já
é de casa, fique à vontade, descansa. Mais tarde quero todos alegres na festa.
_Sem problemas, querida. Vá e fique o tempo que puder.
Ainda
ouvindo os gritos do filho, Priscila subiu e entrou no quarto. Tatiane estava
vendo a cena da varanda.
_E
em pensar que era para eu estar assim com meus pais.
_Chega de enrolar. Senta aqui e me conta tudo – Priscila sentou-se na cama.
Tatiane
sentou timidamente, antes de falar ficou calada alguns segundos refletindo e
relembrando tudo.
_Eu
e o Cadu estávamos essa manhã fazendo a mala para ir pra BH quando ele sem
perceber deixou o celular destravado. Alguma coisa me pediu para ver e nem
precisei ir longe... – ela ergueu o rosto para ver Priscila – A conversa dele
com a Ivy estava fixada. Estranhei porque nem a minha conversa com ele no Whats
ele deixa fixada, na verdade há dias que vinha estranhando o comportamento
deles lá no estúdio. Ai, Pri... – sua voz voltou a ficar embargada.
Priscila
deixou que ela mais uma vez chorasse. Daquela vez foi rápido e logo Tatiane
estava se recompondo para continuar:
_Eles
tinham discutido na conversa, ela falava sobre não admitir que ele fosse casar
comigo e que dava um prazo para que esse “conto de fadas” terminasse. Eu criei
coragem e fui ler as conversas anteriores e todas continham teor sexual ou
cantadas baratas. Óbvio que ele ao flagrar o celular na minha mão fez maior
confusão e eu o pressionei. Ele confessou e se ajoelhou me pedindo perdão, mas
foi muito forte.
Tatiane
chorou mais um pouco e Priscila sentiu sua dor. Abraçou-a mais uma vez,
demonstrando apoio.
_Eu
sei como é dolorida uma traição, Tati. Você sabe o quanto sofri ainda quando
achava que somente eu amava e o Victor me traía. Às vezes me achava muito
idiota por aceitar ele vir me pedir perdão. Então sei bem o que está sentindo
nesse momento.
_A dor mesmo não é nem pela traição, Pri. Até porque eu não sou santa nesse
relacionamento, mas é por saber que eles me usaram para te afastar daquela
empresa, por imaginar que se eu chegasse a mais um pouco e aquela mulher
chegaria a tomar tudo meu, até o Cadu.
_Eu nunca fui com a cara dela. Você sabe.
_Hoje eu sei que isso era sua intuição de amiga.
_Sinceramente, não sei. Só quero saber mesmo o que você fará, afinal de contas
ainda está recente. O melhor é deixar alguns dias passarem.
_Tem razão, agora mesmo queria matar o Cadu.
_Isso vai passar. Se vocês se amam mesmo haverá o perdão.
_Assim espero.
Ficaram
caladas por alguns minutos, Priscila por lembrar-se das decepções que tivera
com Victor, Tatiane por estar envergonhada com a atual situação.
_Tati...
– Priscila falou após alguns minutos – Com o que quis dizer sobre não ligar
para a traição de Cadu?
_Porque eu também o traí.
Priscila
ficou boquiaberta encarando a amiga. Nunca imaginaria sua amiga traindo o noivo
e sequer contando.
_Como
assim?
_Eu vou falar agora porque já é passado, não tão distante, mas é... Eu e o Leo.
_O que tem vocês doi... – mais uma vez Priscila ficou perplexa – Tati, então
você...
_É. Sou a tal amante que estava ao telefone com ele na noite do evento, que por
sinal a Tatianna fez maior confusão e houve a separação.
Aquele
dia nem havia terminado e ela já estava aturdida com o tanto de coisas que
descobriu. Lembrou-se bem de na época ter falado para Tatiane sobre a suposta
amante.
_E
eu naquele dia te xingando sem nem saber que era você.
_Amiga, a gente sabe que a culpa de tudo não fui eu, o Leo já não suportava
ficar preso a um casamento. Eu não sei explicar, mas toda vez que me encontrava
com o Leo sentíamos uma química forte. Talvez foi preciso encerrarmos esse
ciclo de vez.
_Então quer dizer que com o Cadu saindo da sua vida, você... – instigou a amiga
para saber até onde ela iria.
_Acha que eu e o Leo daríamos certo? Nem ferrando! Mesmo sendo um idiota eu
ainda amo o Cadu. Entre ele e Leo sabemos bem quem vai bater na minha porta.
No
fundo Priscila admirava a forma de Tatiane viver. Ela não estava errada em
aproveitar todas as oportunidades que a vida oferecia, mas aquilo a fazia
refletir se ao contrário teria coragem de trair Victor. Não passava por sua
cabeça nem nas piores crises.
_E
agora, vão casar?
_Eu sei que está recente, Pri, mas já tenho a opinião formada de que ainda é
muito cedo. – Levantou-se – Agora preciso ir. Não quero interromper seu momento
com a família.
_Para onde você vai?
_Pra casa. Amanhã vou pra casa dos meus pais.
_Se eu te pedir algo você concorda? – Tatiane ficou pensativa – Vai pra casa,
pega algumas roupas, e fica aqui esses dois dias. Se você voltar pra São Paulo
agora o aeroporto vai estar lotado, voos cancelados. Fica, aproveita comigo a
festa.
_Mas você tem o Victor, sua família, o Pedrinho...
_Victor não vai vir. Ele acabou de me ligar.
Tatiane
ficou calada, observando a amiga.
_Sabe
o que é, Pri, a família do Victor está aí, eles vão desconfiar...
_Ninguém sabe sobre vocês. E como você disse, é passado.
_Vou pensar – abraçou a amiga mais uma vez – Agora preciso ir. E obrigada por
tudo.
*
Priscila
estava com Pedrinho nos braços. Após a saída de Tatiane ficou mais leve,
esqueceu um pouco dos seus problemas e viveu o momento família. Marisa e Sandra
ficaram conversando com ela por longo tempo quando aos poucos foram saindo.
Geane havia ido embora e como sempre, o mês seguinte seria de férias para a
funcionária. Estava colocando o filho para dormir em seu quarto quando a mãe
apareceu.
_Ele
é tão lindo dormindo – sussurrou alisando os poucos cabelos que o neto tinha.
_E quando acorda fica ligado em uma tomada – Priscila também ficou observando o
filho.
Pedrinho
estava em seu sono mais profundo após passar a tarde inteira se divertindo com
os avós. Priscila aproveitou para ir até o closet e verificar a roupa que
usaria naquela noite, Sandra foi junto e ficou observando tudo.
_E
como você está?
_Bem.
_Impressão minha ou o nome de Victor não foi mencionado por ninguém desde que
cheguei?
_Estamos bem – Priscila sentou no puff e encarou a mãe.
_Seja sincera comigo... Ele não está por aqui e isso quer dizer que tem algo
acontecendo?
_Acha que estamos em crise? – rolou os olhos ao ver a mãe fazer um sinal de
positivo com a cabeça – Ninguém comenta nem toca no nome dele porque hoje
infelizmente ele não poderá estar aqui. Eles ficaram presos no aeroporto, em
Londres. Então tanto para dona Marisa como para mim está sendo exaustivo ter
que imaginar que passamos tantos meses combinando essa festa para no fim ele
não estar.
Priscila
sabia que Sandra tinha algo a mais para falar. Esperou pacientemente.
_E
o que fez esse mês de dezembro?
_Fiquei em casa, com meu filho. Porque?
_Eu liguei uns dias atrás pra seu trabalho e disseram que estava de férias. Eu
só não entendo porque não foi me visitar.
Para
focar no assunto Priscila sabia que teria que falar sobre o que aconteceu com
Tatiane.
_Por
isso achou que eu e o Victor estávamos em crise? Mas não foi. Eu só estava
cansada, longe do meu filho. Então conversei com a Tati e juntas achamos melhor
eu me dedicar esse fim de ano ao Pedrinho.
Sandra
se aproximou da filha, sentia que ela escondia algo.
_Sabe
que sempre que precisar pode contar comigo, não é?
_Claro que sim, mãe.
_Eu sei que às vezes pareço fechada, que nunca sentamos para conversar sobre
sua vida, mas quando quiser desabafar estou aqui.
_Pode deixar dona Sandra – Priscila levantou-se beijando a testa da mãe –
Sempre soube disso. Agora vamos escolher o seu look para a festa – saíram do
quarto abraçadas.
***
Naquela
noite, todos estavam animados, divertidos. Alguns queriam esquecer de que
Victor e Leo não estariam ali, entre eles. Uma dessas pessoas era Priscila, mas
era inevitável. Em um momento sozinha olhou para a piscina, lembrou-se do
marido e sentiu o coração apertar. Olhou a última mensagem da qual havia
mandado para ele e suspirou.
_Uma
mulher apaixonada não quer guerra com ninguém.
A
voz de Tatiane acordou-a do transe quando ergueu o rosto. Tinha achado que a
amiga não iria estar ali. Abraçou-a forte.
_Eu
pensei que o Cadu tinha ido lá e vocês tinham feito as pazes.
_Meu Deus, Pri – Tatiane rolou os olhos – Eu sou corna, mas não sou besta.
Aquele dali pra conseguir o meu perdão vai ralar muito – mudou de assunto
bruscamente para não chorar diante de Priscila – E o Victor?
_Nada. Disse agora no fim da tarde que conseguiram um voo, mas que não promete
chegar antes de seis da manhã. Eu não quero pensar nisso, Tati. Está me doendo
muito.
_Não me pede nada, porque eu não quero pisar naquele salão – juntas olharam
para o local onde estava acontecendo a festa.
_Para com isso, Tati – repreendeu a amiga – Digo e repito: a família deles
sequer sabem o que aconteceu entre vocês. Vem.
Segurou
na mão da amiga e juntas foram para a pista de dança. Tatiane segurou Pedrinho
nos braços e ficaram empolgados até a contagem regressiva. A cada número Priscila
olhava esperançosa para a entrada da casa, em uma tentativa vã de ver o marido
chegando. Sentiu alguém lhe abraçando e deixou que as lágrimas caíssem lentas.
_Querida,
se você chorar eu também irei – Marisa aproximou-se dela.
_Me perdoa, Dona Marisa, mas está sendo difícil para mim.
Abraçaram-se
e deixaram toda a dor se esvair em lágrimas tímidas.
_Com
licença, vou retocar minha maquiagem – Priscila saiu e foi ao banheiro.
Mais
uma vez checou o celular. Nenhuma ligação de Victor, nem mensagem. Suspirou
mais uma vez naquela noite. Na volta para a festa achou Tatiane sentada em um
banco próximo à piscina.
_Tati,
está tudo bem?
_Eu acho que não.
O
rosto da amiga estava banhado em lágrimas. Aquela noite não estava sendo fácil
para ninguém. Sentou-se ao lado de Tatiane e abraçou-a de lado.
_Eu
sabia que aquela pose de durona era só de fachada.
_Não foram poucos meses, amiga. Eu e o Cadu tivemos um lance de anos. Não sei
se consigo perdoá-lo, mas meu coração está tão espremido, dolorido, me pedindo
para chorar. Me perdoa se eu estraguei sua festa.
Priscila
deixou que ela estravasse sua dor em choro, soluços. Ela sabia o quanto doía uma
traição, por mais que Tatiane tivesse dado o troco sem nem imaginar.
_Isso
é a prova que você ainda o ama, Tati. E tenho certeza que esse choro se
transformará em perdão amanhã.
_Tomara, viu. Está sendo um caos lembrar disso. Eu queria tanto esquecer, eu
queria tanto não chorar.
_Mas chore. Deixe tudo sair de dentro de você.
Ficaram
abraçadas em silêncio, apenas o barulho que naquele momento estava baixo,
abafado para o local onde elas estavam. De repente, Tati sussurrou em meio ao
choro:
_Obrigada
por não ter me escorraçado hoje.
_Você sabe que eu nunca faria isso.
E
mais uma vez o silêncio se fez presente.
*
A
festa acabou após às quatro da madrugada. Apenas Paula estava animada,
cantando, dançando, chamando as tias que naquela noite tentaram alegrar o
ambiente. Priscila já havia entrado em casa, colocado o filho para dormir,
ainda conversou com Sandra e Ícaro. Quando desligou o som ajudou a cunhada a subir
as escadas, levando-a para o quarto de hóspedes.
_Agora
deixe que o resto é comigo, Priscila – Marisa garantiu.
_Tem certeza? Posso ajudar a Paula a tomar um banho.
_Ela está bem, já entrou no chuveiro sozinha – riram. – E você, vai ficar bem?
_Sim. Daqui a pouco o Victor chega e vai alegrar nossos corações.
_Que assim seja. Não gosto nem de pensar que estão em um voo.
_Mas eles virão acompanhados da força divina. Vamos ter fé. Tchau e boa noite.
Desceu
a escada e foi mais uma vez para a área externa da casa, o salão precisava ser
limpo, mas ela sabia que não iria fazer aquilo sozinha. Deixou tudo para o dia
seguinte e fez apenas apagar as luzes. Priscila olhou para o céu, a aurora se
formava, avisando que aquele dia iria ser quente. Pegou uma garrava de vodka
long neck e sentou-se nos degraus na entrada da casa. Enquanto bebia lembrou-se
de quando ele a levou para verem aquela casa. Nunca imaginou que um dia teria
aquele luxo todo.
_Sonhando
acordada? – Tatiane apareceu já vestida com um pijama.
_Eu não vou conseguir dormir – tomou um longo gole da vodka.
_Confesso que estou com sono, mas não suporto te ver assim, toda triste – tomou
a garrafa das mãos da amiga e bebeu um gole.
_Eu vou ficar bem, Tati. É só o Victor aparecer que tudo ficará bem.
Ouviram
o canto dos pássaros e deixaram aquele clima de inicio da manhã assim, em
silêncio. Tatiane quebrou-o:
_Eu
vou pra casa da minha mãe.
_Quando?
_Hoje mesmo. Ela precisa saber da verdade sobre o casamento e eu preciso de um
abraço dela.
_Caso queira ficar você já é de casa, Tati.
_Eu sei, Pri. Mas quero começar meu ano ao lado da minha família. – levantou-se
– Vai ficar bem?
_Sim. Pode ir descansar. Daqui a pouco irei.
Mais
uma vez estava sozinha ali, mais uma vez lembrando de quando visitou aquela
casa. O ano anterior tiveram inúmeros momentos bons, o nascimento de Pedrinho,
os meses seguintes envolvidos. Seu coração ficou oprimido. Só queria Victor
ali, lhe abraçando e dizendo que tudo ficaria bem. Olhou para o céu e as
lágrimas caíram. Ouviu barulho na entrada da casa e rapidamente limpou sua
visão que estava embaçada por conta das lágrimas. Aquele carro, ela conhecia...
Era ele chegando.
O
coração bateu descompassado e descalça ela se viu caminhando até a garagem.
Naquele momento praguejou aquela casa ser imensa e ter que percorrer o jardim. Victor desceu do veículo, abrindo a porta traseira para pegar apenas a
mala de mão. Assustou-se quando viu sua esposa em passos lentos vindo em sua
direção. O coração acelerou os batimentos também e seus pés ganharam vida. Ele
estava cansado, mas ao abraçar Priscila deixou apenas aquele fardo de dias
dispersar.
Como
era gostoso aquele abraço, Priscila se beliscava o tempo todo achando que
estava sonhando, mas era seu Victor envolvido naquele abraço que ela ofereceu.
Ambos estavam precisando daquilo.
_Meu
amor... – Priscila sussurrou em meio a um choro.
_Shhh... calma. Estou aqui.
*
Os
primeiros minutos dentro de casa Priscila deixou apenas que Victor aproveitasse
o lar, o cheiro da casa, a sensação de que existiam outras pessoas no andar de
cima dormindo. Ele comeu pouco, pois as olheiras já entregavam que as noites mal
dormidas estavam sendo corriqueiras. Após isso, deixou-o que tomasse um banho
demorado e preparou tudo, até o pijama dele. Queria gritar para todos que ele
havia chegado, mas lembrou-se da hora que todos foram dormir.
_E
como foi tudo por aqui? – Victor deitou-se na cama e soltou um suspiro de
alívio e cansaço.
_Dona Marisa e Paula seguraram as pontas aqui. A festa foi divertida, suas tias
adoraram o salão e já estão programando a festa do Pedrinho.
_Isso é a cara delas – sorriu imaginando-as
_A Tati está dormindo aqui em um dos quartos.
_Com o Cadu?... – franziu a testa – O que eu perdi nesse tempo que estava
ausente?
_Fiquei tão assustada quanto você, mas digamos que... Ela abriu os olhos quanto
ao lance do Cadu e da Ivy.
_E veio bater na sua porta?
_Fazer o quê? – levantou os ombros rapidamente fazendo expressão à frase.
Priscila
sentiu que Victor estava tenso e não era sobre a amiga dela.
_E
você, como foi por lá? – sentou-se na ponta da cama e acariciou o cabelo
molhado dele.
_Os shows foram bons, como sempre, mas o Leo torrou minha paciência.
_Brigaram?
_Sim.
_Meu Deus, Victor. Tenta ter calma com seu irmão... – sua fala foi interrompida
por a voz do marido.
_Você não sabe como fiquei puto, Priscila, quando vi que os voos foram
cancelados. Isso tudo por ambição dele, que poderia ter negociado essa turnê
para o começo do ano – respirou profundamente – Mas no meio da discussão disse
para ele que não quero mais isso.
_Na próxima você quem fica à frente da situação.
_Acho que não vai ter próxima, Priscila. Já estou decidido que pra mim esse ano
é o último da dupla.
_Não fala besteira de cabeça quente, Victor – Priscila afastou-se para ir tomar
banho. Deu dois passos e foi interrompida com a voz dele.
_E sabe o que é pior? Eu nunca me senti tão confiante como estou agora. É isso
o que quero.
_O que você precisa é de um bom descanso. Vai dormir e amanhã você repensa
nisso.
Ela
sabia que quando voltasse do banho ele estava tão cansado que jamais iria conseguir esperar
acordado para lhe abraçar. Deixaria esse momento para o dia seguinte, quando
estivessem a sós dentro de casa e com o fogo em alta. Vestiu um baby-doll leve
e deitou-se de costas para ele que já estava de olhos fechados. Sentiu a cama
balançar de leve e as mãos dele em sua cintura.
_E
isso são modos de dar boas-vindas ao seu marido, moça?
A
voz dele sussurrando ao seu ouvido deixou-a completamente acordada, zero
cansada. Virou apenas o rosto por cima do ombro e sentiu ele lhe encoxar
enquanto buscava os lábios para beijar. O que se tornou leve foi para insano,
devasso, mas que não ultrapassou daquilo. Apenas uma promessa e seu corpo
ferveu todo:
_Vamos dormir para mais tarde matarmos essa saudade que eu sei que você também está.
*
A
primeira visão de Victor, quando acordou, foi a varanda mostrando um dia
ensolarado. Ele checou as horas, já passava das duas da tarde. Ouviu barulhos
de som e várias pessoas falando. A casa estava cheia, isso ele adorava.
Permaneceu deitado e olhando o teto enquanto deixava seu pensamento divagar.
Mais
uma vez lembrou-se da discussão que havia acontecido com o irmão, nunca esteve
tão confiante como naquele momento. O próximo passo seria realmente sentar com
Leo, dar uma pausa na música e talvez no futuro voltar a frequentar os palcos
da vida. Foi ao banheiro e tomou um banho demorado, sentindo cada parte do seu
corpo relaxar. Estava em casa, sabia que sua esposa e toda a família estariam
ali. No meio do caminho foi abraçando quem surgia em sua frente e logo estava
no jardim, perto da piscina observando a alegria de todos ali: Paula comandava
o som, Marisa sentada em uma espreguiçadeira ao lado de Sandra, Ícaro tomando
conta da churrasqueira, Priscila e o resto da família tomando banho de piscina.
Marisa
ou ver o filho abriu um sorriso largo, Vindo à sua direção e com esse gesto
alertando as demais pessoas de que ele estava ali.
_Meu
filho!
Aquele
abraço foi tão gostoso de sentir quanto o que teve logo no início da manhã por
Priscila. Em seguida os demais se aproximaram, puxaram assunto, o levaram para
a varanda próxima da churrasqueira e assim foi o que aconteceu nas horas
seguintes. Depois de muita conversa sentiu alguém com o corpo molhado lhe abraçar
por trás.
_Enfim
consegui chegar perto do meu ídolo – Priscila sussurrou em seu ouvido.
A
risada foi involuntária quando ele virou-se e a abraçou. Sandra também se
aproximou com Pedrinho nos braços. Agora o pequeno apenas gritava de felicidade
enquanto Victor o pegava no colo e girava no ar.
_Que
saudade que eu estava sentindo disso – falou após alguns segundos quando ele e
Priscila conseguiram ficar a sós.
_Assim que me levantei todos queriam saber que horas você chegou e se iria
acordar logo.
_Eles bem sabem minha rotina.
_Nem se assustaram quando passou de meio-dia e você não estava entre nós –
riram alto. – Agora vem socializar.
Priscila
segurou na mão mais próxima dele e foram para perto da piscina. Pedrinho estava
saltitante, feliz enquanto Sandra brincava com ele dentro da água.
_Pri,
quanto tempo faz que ele está na piscina?
_Pouco tempo. Por quê?
_Nada... – Victor queria ficar calado, mas não se conteve – Ele não vai pegar
um resfriado?
_Pelo amor de Deus, Victor – Priscila rolou os olhos enquanto dava um risinho –
Aproveita esse momento e deixa seu filho também.
Aquela
tarde passou rápida. A noite foi de pizza que encomendaram e Victor tocando
violão para animar. Ali ele sentia a paz reinar, a alegria lhe invadir mais do
que quando esteve nos melhores palcos, dias atrás. Foi naquele momento que ele
teve a certeza do que queria para os próximos anos: ter mais momento com sua
família.
*
_Já
está mais calmo quanto a sua situação?
Priscila
indagou enquanto penteava o cabelo, após o banho, e entrava no quarto. Victor
estava sentado encostado na cabeceira da cama completamente em outro mundo
quando voltou a vida real.
_O
que disse?
_Ligou para seu irmão para pedir desculpas sobre o que ocorreu na viagem?
_É sério que você acha que eu fui o errado?
_Não é isso, Victor – Priscila sentou-se na ponta da cama com a escova de
cabelo nas mãos. – Só acho que é sempre bom começar o ano desejando o bem para
as pessoas.
_Eu não vou ligar, pois minha decisão já está tomada!
_Tem certeza que é isso mesmo o que quer?
_Nunca tive tanta certeza como estou agora, Priscila.
_Vamos fazer o seguinte: enquanto estivermos na casa dos meus pais e com minha
família você fica refletindo. Caso tenha a certeza, assim que chegar você
conversa com o Leo e só depois conversem com sua mãe.
Priscila
havia tocado em um ponto da história que ele sequer lembrou-se. Ele sabia que
quando anunciasse para Marisa, ela ficaria abalada. Respirou fundo, estava
farto daquela história. Olhou pra o corpo da esposa, ela trajava apenas uma
camisola de seda, suas coxas levando para um caminho que o fazia acender a
chama. Bateu nas próprias pernas.
_Vamos
parar de falar disso e vem aqui.
Ela
entendeu a mensagem e largou a escova em um canto qualquer, logo se sentou no
colo dele e o abraçou. As mãos de Victor desceram até sua região glútea
apertando-a e dando um tapa de leve. Seu corpo estremeceu e enquanto se movia
de leve sentiu o membro dele ganhar vida.
_Que
saudade eu estava de você, Pri.
Enquanto
buscava os lábios dela para beijar as mãos foram para frente, mais precisamente
as coxas, os dedos adentraram aquela camisola e ali ele notou que ela estava na
mesma intenção, pois estava sem calcinha. A partir dali o caminho foi muito
rápido e com os dedos ativou a excitação dela. Naquela mesma posição Priscila
ergueu um pouco só para ele colocar o membro para fora e se encaixarem
perfeitamente. Como a casa estava cheia, sussurros, palavras ousadas e gemidos
foram milimetricamente calculado para sair no volume mais baixo possível.
Atingiram o ápice juntos na primeira. Ainda naquela noite se amaram com a
presença apenas das estrelas.
***
Priscila
chegou à casa da avó acompanhada de Sandra, Ícaro, Pedrinho e Victor. Haviam
acabado de chegar de viagem, deixando apenas as malas na casa dos pais e
ficaram rodeados da família animada. Todos queriam ter seu momento com o
mascote e foi nisso que ela agradeceu. Deixou o marido ali com seus tios e foi
até o quintal. Quantas vezes brincou naquela grama, embaixo daquela árvore
enorme que ofertava uma sombra perfeita. Rebeca estava com Thomas, sentados no
chão, brincando. Bateu uma nostalgia de quando era criança.
_Você
veio para o nosso lugar preferido.
Rebeca
ao vê-la saltou feliz, abraçando forte.
_Pri!
Que saudade!
_Eu também estava. Posso entrar para a brincadeira, Tom?
O
menino loirinho olhava tímido para aquela mulher que havia acabado de chegar.
Ele viu Priscila sentar ao seu lado na grama e pegar um brinquedo. Enquanto fazia
isso, ela recordou-se da proposta que Victor havia dado de adotá-lo. A prima a
tirou daquela lembrança:
_E
onde está o Victor?
_Lá. Com certeza tio Almir vai pegar o violão do vovô e pedir para ele tocar e
cantar.
_Depois vou falar com ele. Quero saber de você, como está. Vamos trocar
receitas de mamães – riram com vontade.
_E em pensar que fazíamos isso quando éramos crianças. Você sempre chegava com
a melhor boneca, a mais cara porque tia Suzy comprava.
_Mas lembra de que eu detestava aquelas bonecas e sempre pedia para trocar com
aquelas de pano que você tinha.
Priscila
olhou para o horizonte, lembrou-se bem daquela fase. Sorriu com a doce
lembrança.
_Mas
chega de passado. Conte-me como você está Rebeca. Tia Suzy sempre liga para me
contar, mas quero saber tudo vindo de você. Soube que está trabalhando em um
escritório.
_É... – Rebeca suspirou.
_O que houve? Não está gostando?
_Não é isso. Eu amo o que faço, mas... tem um lance me incomodando muito.
_Sabe que estou aqui para te ouvir, né? – tocou a mão da prima que repousava na
coxa.
Rebeca
ficou alguns segundos calada. Olhava para os lados, respirava fundo, mas já
sabia que estava no seu limite ficar tanto tempo calada.
_Pelo
menos você não mora aqui, então posso te contar.
_Está apaixonada? Quem é o sortudo?
_Adivinha? – olhou para Priscila. – Meu patrão.
Priscila
ficou estática por alguns segundos. Prometeu a si mesmo que não iria julgar a
prima, mas para logo no começo ela não querer desabafar sabia que coisa boa não
estava acontecendo. Rebeca não se intimidou, voltou a falar:
_Eu
não queria me apaixonar, mas vê-lo sempre, todo dia, me deixou carente. Você é
mãe, Pri, então sabe que existem momentos que nós precisamos pensar amor
próprio, ficamos vulneráveis. E foi numa dessas que fiquei encantada e ele
sequer saber ou notar.
_Então é um amor não correspondido?
_Não era, mas uma pontinha de esperança se acendeu em mim quando ele me pediu
para que eu fosse junto com ele no dia da audiência do divórcio. Ele me
instruiu, mostrou o caso e naquele mesmo dia eu bebi além da conta e acabei
indo parar em um motel com ele.
Aquilo
não era nada de absurdo, assim Priscila pensou e expôs:
_Não
vejo nada de indecente nessa situação.
_Para nós duas não é, mas vai dizer pra sua “tia Suzy” que o cara que estou
saindo há meses e que frequenta a casa apenas como um bom amigo é recém
divorciado. Você sabe como ela é preconceituosa. Até tentei instigar o terreno
onde estava pisando e falei pra ela que ele havia se separado e sabe o que ela
me respondeu?
Priscila
fez um sinal negativo com a cabeça induzindo a prima para continuar:
_Que
logo ele iria voltar pra mulher e que se tinha vagabunda na história iria arder
no fogo do inferno. O pior é que ele frequenta lá em casa e o Thomas está muito
empolgado.
_Mas você tem certeza que sua mãe não desconfia Becca?
_Claro que não. Ela acha que ele é um bom amigo para mim, mas que eu preciso
mudar de escritório e ir para um melhor para que eu possa mudar minhas
amizades, pois preciso andar com a alta da cidade. E sabe qual o meu maior
medo, Pri? – mais uma vez esperou que a prima a induzisse a continuar – De ele
estar me usando para voltar com a esposa.
Aquela
situação estava mais enrolada do que Priscila imaginava. Ela não conseguia
entender como Rebeca conseguia entrar em tanta furada em uma só encarnação.
_Se
ele está muito na sua ele não vai voltar para um passado que o magoou.
_Mas pra todos eu serei sempre a piranha, a outra, a amante. E sinceramente, Pri,
é um sentimento horroroso você ter que viver às escondidas.
_Eu nem sei o que te falar prima.
_Só agradece por você nunca estar em uma situação dessas. Você tem um bom
marido que te faz feliz em cima de uma cama, então você não vai procurar fora
nem ele. E você nunca foi amante. Sua vida é linda.
Priscila
não soube como, mas de repente, aquelas palavras invadiram seus sentimentos, um
presságio de que algo muito ruim estaria por vir na sua vida, algo referente à
traição, carne fraca, desejo muito sombrio onde iria abalar seu casamento.
Por
um minuto ela imaginou a traição sendo da parte de Victor, mas mal sabia ela
que inverteria os papéis.
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